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O
fim da escravidão não significou, necessariamente, liberdade.
Ao contrário: Do dia para a noite,
milhares de pessoas, em todo o Brasil, estavam completamente desamparadas.
Entre os senhores de escravos o sentimento era de revolta, pois o fim da escravidão
causaria inúmeros prejuízos
aos seus interesses.
Contudo,
vamos deixar um pouco os desdobramentos econômicos de lado para focar,
especialmente, na questão religiosa. De
que forma o fim da escravidão impactou a liberdade religiosa dos negros?
Para
responder a esta questão, precisamos voltar um pouco mais.
Desde
1810, quando o governo assinou o Tratado
de Livre Comércio com a Inglaterra, houve uma significativa abertura no
campo religioso brasileiro. Isto por uma razão simples: A Inglaterra era um país essencialmente protestante e o governo
imperial (oficialmente católico e que proibia a presença de outras religiões)
não queria criar problemas comerciais por causa de religião.
Assim,
no
artigo 12 do referido tratado é dito o seguinte:
“[...] não serão perturbados, inquietados, perseguidos ou molestados por causa de sua religião, mas antes terão perfeita liberdade de consciência e licença para assistirem e celebrarem o serviço divino em honra do Todo-poderoso Deus, quer seja dentro de suas casas particulares, quer nas igrejas e capelas, que Sua Alteza Real agora, e para sempre graciosamente lhes permite a permissão de edificarem e manterem dentro de seus domínios.”
Portanto,
os ingleses que porventura viessem para o Brasil residindo temporariamente ou
fixamente, poderiam exercer suas religiosidades sem intervenção do Estado,
embora com uma série de restrições, como por exemplo, não criticar a igreja
católica, etc.
O
fato, porém, é que esta abertura, permitindo a entrada do protestantismo no
Brasil, também abriu um caminho para outras religiões, que chegariam
posteriormente.
A Constituição
de 1824, em seu artigo quinto, diz:
“A religião Católica apostólica romana continuará a ser a religião do império. Todas as outras Religiões serão permitidas com seu culto doméstico, ou particular em casas para isso destinadas, sem forma alguma exterior do Templo.”
Perceba
que, de 1810 para 1824, a legislação abriu um precedente muito curioso,
permitindo, agora, que todas as religiões fossem praticadas desde que em um culto
doméstico ou em uma casa própria para os ritos, contando que não tivessem forma
exterior de templo (só a igreja católica poderia ter essa arquitetura).
Na
prática, essa liberdade religiosa se estendia às correntes protestantes e não
às religiões Afro-Brasileiras ou outros segmentos. Tanto é que, no Código
Penal de 1890,
artigo 157, podemos ler:
“Art. 157. Praticar o espiritismo, a magia e seus sortilegios, usar de talismans e cartomancias para despertar sentimentos de odio ou amor, inculcar cura de molestias curaveis ou incuraveis, emfim, para fascinar e subjugar a credulidade publica:
Penas - de prisão cellular por um a seis mezes e multa de 100$ a 500$000.
§ 1º Si por influencia, ou em consequencia de qualquer destes meios, resultar ao paciente privação, ou alteração temporaria ou permanente, das faculdades psychicas:
Penas - de prisão cellular por um a seis annos e multa de 200$ a 500$000.”
Como
se pode ver, a liberdade religiosa assegurada no Brasil a partir de 1824 não
era, assim, “tão livre”. Contudo, voltaremos a este assunto no período das
perseguições.
Fiz
este adendo para que você tenha ideia dos contextos que envolveram a liberdade
religiosa no Brasil e o que vigorava ao tempo da libertação dos escravos.
Religiosidades
É
certo que o número
de escravos libertos nas décadas que antecederam o fim da escravidão era
cada vez maior. Estes libertos, quase sempre de forma oculta em suas
residências ou afastados no campo, procuravam exercer a sua religiosidade que,
já neste período, estava mesclada com conceitos de outros seguimentos, recebendo
influências indígenas e católicas.
Fluxo migratório
O
fato, porém, é que a Lei Áurea possibilitou um fluxo
migratório do campo para a cidade. Então, ao longo dos anos, muitas pessoas
saíram da vida no campo e foram “tentar a sorte” em cidades próximas e,
posteriormente, nas grandes cidades e capitais.
Este
fluxo possibilitou um maior intercâmbio cultural e religioso, criando um
contexto efervescente em religiosidades em fins do século XIX. É
esta efervescência que criará campo para o surgimento de religiões como a
Cabula e a Macumba que abrirão caminho para o aparecimento da Umbanda, no
início do século XX.
Contudo,
desde já, gostaria que você refletisse sobre o seguinte: Seria possível construir um caminho de religiosidades indígenas e suas
influências para a formação da Umbanda, da mesma forma que podemos fazer em
relação às religiosidades Afro-Brasileiras?
Note
que eu dediquei o capítulo 2 aos índios/caboclos, demonstrando a importância
dos povos nativos tanto na formação da nação brasileira quanto a influência
destas almas no aspecto espiritual da nossa nação, contudo, eu não consigo
estabelecer um “caminho histórico”, apesar de saber que ele existe,
simplesmente, por que tudo que já li até hoje, tanto no campo religioso, quanto
historiográfico, é voltado para o universo negro, deixando o indígena de lado.
Ao
longo dos anos, esse interesse acadêmico pela religiosidade dos escravos fez
com que muitos pesquisadores vissem a Umbanda como uma religião de origem
africana. Mas, será mesmo? Veremos
isso no correr dos estudos!
Seja
como for, neste capítulo, o que quero que você perceba é que a Lei Áurea, ao dar a liberdade aos negros,
sem buscar inseri-los na sociedade, praticamente os obrigou a sair pelo mundo
tentando encontrar o seu espaço. Esse fluxo migratório não levou apenas mão de
obra do campo para as cidades e das cidades para as cidades grandes e capitais,
levou também cultura e religiosidade, favorecendo o florescimento de outros
movimentos religiosos além do catolicismo e do protestantismo.
Revelações Espirituais
As
entidades me revelaram que o Mundo Espiritual ansiava pela criação de uma
frente de trabalho em que Caboclos e Pretos-Velhos (prioritariamente, mas não
exclusivamente), pudessem trabalhar, trazendo a sua caridade.
Por
esta razão, diversas tentativas foram feitas para que a Umbanda surgisse na
Terra, porém, sem muito sucesso, especialmente, devido ao caráter amoral das religiões que a
precederam, como a Cabula e a Macumba.
Assim,
esses movimentos religiosos não surgiram apenas como formas organizadas de
religiosidades de ex-escravos e seus descendentes livres, mas como partes de um
projeto de trabalho espiritual que visava criar uma frente-de-serviço para as
entidades anteriormente citadas.
Então,
antes mesmo de 1888, a espiritualidade buscava maneiras de implementar a
Umbanda. É por esta razão que aqui e ali surgiram
manifestações religiosas que se assemelhavam à Umbanda, quer em forma, quer em
conteúdo.
Entretanto,
antes de 1908, não foi possível consolidar um projeto que atendesse aos anseios
da espiritualidade, especialmente, por que desejavam
edificar uma forma de trabalho em que os caracteres cristãos estivessem
marcados de forma evidente, não apenas pelo uso de símbolos/imagens, mas pela
adoção de uma moral cristã que guiasse os trabalhos sempre em prol do bem.
É
por esta razão que movimentos como a Cabula e a Macumba acabaram se extinguindo
e, em seus lugares, no começo do século XX, surgiu uma religião que tem “como base o evangelho e como mestre
supremo, o Cristo”.
Até
a próxima aula!
Leonardo
Montes
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