Há alguns anos, recebemos uma caravana de companheiros vindos de Santa Catarina e que aproveitaram a passagem pela cidade para conhecer o nosso terreiro.
Fizemos uma gira especial para recebê-los e, após o trabalho, um dos elogios mais frequentes se deu em razão da leitura de O Evangelho Segundo o Espiritismo, que o presidente da casa fez, antes do início dos trabalhos.
Lembro-me de um senhor que me disse frequentar terreiros em todo o Brasil, pois viajava muito a trabalho e que, em todos os anos em que peregrinara pelo território nacional, havia encontrado um único terreiro que realizava a leitura do Evangelho, tendo agora encontrado o segundo.
Na hora, fiquei bastante impressionado, pois embora compreenda que exista todo um movimento que procura se afastar das influências espíritas da Umbanda, ao passo que se aproximam das influências afro com avidez, não imaginava que tão poucas casas trouxessem o Evangelho para dentro de seus trabalhos.
Se consultarmos o Regimento Interno da Tenda Espírita Nossa Senhora da Piedade (disponível na internet), encontraremos no art. 17, item 1, o seguinte:
São deveres de todos os frequentadores:
Procurar conhecer o Espiritismo Cristão pela leitura de obras doutrinárias tais como:
- O Evangelho Segundo o Espiritismo;
- O Livro dos Espíritos;
- O Livro dos Médiuns;
- O Espiritismo, a Magia e as Sete Linhas de Umbanda.
Dos cinco livros básicos do Espiritismo, o regimento (autorizado pelo Caboclo das Sete Encruzilhadas), recomendou três, estando em primeiro lugar, justamente, O Evangelho Segundo o Espiritismo.
Por esta razão e sabedor da importância da referida obra na orientação do espírito humano, recomendo que todos os terreiros o adotem.
Leonardo Montes
Se estivesse entre nós, Zélio teria completado 130 anos de idade ontem (10/04). Aproveitando a ocasião, seu bisneto, Leonardo Cunha, atual presidente da Tenda Espírita Nossa Senhora da Piedade, usou as redes sociais para falar um pouco sobre seu bisavô e também sobre seu irmão, ambos aniversariantes e desencarnados.
Entre curiosidades pessoais e da Tenda, Leonardo Cunha fez um desabafo sobre a desvalorização do papel do seu avô dentro da religião, processo iniciado com acadêmicos, décadas atrás e atualmente embalado por umbandistas que tentam – a todo custo – criar uma narrativa sobre a origem afro da #Umbanda.
Recentemente, a BBC Brasil publicou uma matéria sobre isso.
Num dos trechos, diz-se que Zélio não apenas não “criou” nada, como também acabou se apropriando e invibilizando a religiosidade africana de onde supostamente a Umbanda derivaria... Existem tantos absurdos nesta matéria que resolvi fazer uma análise dos pontos principais no blog: umbandasimples.com.br
Por esta razão, resolvi escrever esse texto, sugerindo que todos acessem a página da Tenda Espírita Nossa Senhora da Piedade, no Facebook (só digitar o nome na busca) e compartilhem o conteúdo que ali foi colocado, pois é de extrema relevância em nosso cenário.
Não é preciso praticar a Umbanda nos moldes nascentes para se reconhecer o valor e importância de Zélio de Moraes, tudo que teve que abrir mão, todo o seu trabalho e dedicação para que a religião nascesse e prosperasse, chegando até os nossos dias, para que então pudesse ser desvalorizada, dentro de sua próprias fileiras, por militantes que abraçaram uma boa causa, mas que frequentemente perdem a mão em suas próprias narrativas e ideologias.
Leonardo Montes
Não reproduzirei o texto por completo aqui, para evitar problemas de direitos autorais. Contudo, reproduzirei alguns trechos da reportagem, apresentando o meu contraponto. Os trechos entre aspas e em itálico são citações da matéria.
“A começar pela data: 15 de novembro de 1908. Sim, um 15 de novembro, aniversário da Proclamação da República, data portanto da criação do Brasil contemporâneo”.
Segundo o autor, a escolha do dia 15 de novembro como marco inicial da Umbanda é uma espécie de carona pega por Zélio, pois é também a data da Proclamação da República (quando, enfim, a monarquia caiu) e, portanto, teria sido escolhida por seu valor simbólico, nacionalista.
Não se considera que, talvez, por ser feriado, fosse mais fácil comparecer à reunião espírita que ocorreria naquele dia, assim como também se desconsidera que o feriado em questão é apenas uma coincidência na sequência de fatos que marcaram o início da mediunidade de Zélio (apesar de, particularmente, penso, seja muito mais adequado colocar o dia Nacional da Umbanda em 16 de novembro, quando efetivamente houve a primeira cerimônia da religião).
(...) “é negar que a umbanda já vinha sendo praticada por negros oriundos da África e seus descendentes em solo brasileiro” (...)
Em que região da África ou do Brasil a Umbanda era praticada? Note, caro leitor, que há sempre este argumento da anterioridade da religião, apesar de nunca indicarem onde e como isso teria acontecido.
(...) “é entregar a primazia da religião afrobrasileira a um homem branco”.
Esse é realmente um ponto indigesto. Os que se esforçam para criar uma Umbanda afro-brasileira sempre se deparam com o problema de que Zélio era branco e de classe média. Então, não podendo ignorar sua história, só resta distorcê-la...
(...) “Para o historiador Guilherme Watanabe, pai de santo do terreiro Urubatão da Guia, em São Paulo e membro fundador do Coletivo Navalha, Zélio é "a representação de uma grande construção histórica", do "mito de fundação que, a partir dos anos 1960, começa a se fazer no Rio". "Uma grande mentira".
Mito de fundação a partir de 1960? A história do Zélio, até onde sabemos, aparece pela primeira vez nos jornais cariocas no dia 07 de maio de 1924, quando o jornalista Leal de Souza publica uma matéria no jornal A Noite, intitulada: Um louco em uma sessão espírita. A matéria cita Zélio e a Tenda Nossa Senhora da Piedade.
O que houve a partir de 1960, realmente é a construção de um mito: o de uma Umbanda afro e, às vezes, afro-brasileira, coisa que nunca existiu. Este mito tem raízes profundas e é reproduzido, inclusive, na academia.
Há um excelente artigo de Láreserá, intitulado: Zélio de Moraes e o caboclo das sete encruzilhadas: mito de origem ou reconstrucionismo histórico? – Neste artigo, cujo link está no próprio título, o autor demonstra de forma cabal a origem dos erros das pesquisas em que todos os demais acadêmicos se apoiaram para repetir as ideias errôneas de que Zélio, quando muito, foi apenas um personagem importante da religião.
Convido o leitor a lê-lo. É extenso, mas depois de lido, não restará dúvidas sobre este assunto.
(...) “Ele é caboclo mas, dentro do mito, também é um padre jesuíta. O que cria uma disforia total, uma loucura promovida pelo processo de embranquecimento [da umbanda]", diz Fiorotti.”
Qualquer adepto minimamente esclarecido sabe que o espírito pode encarnar entre diversos povos, diversas culturas e assumir, portanto, diferentes imagens de si mesmo. O próprio caboclo, através de Zélio, dizia ter sido padre numa encarnação, como também dizia ter sido indígena, em outra. Logo, não há nenhuma “disforia” (olhem o termo!), trata-se de algo corriqueiro no âmbito da espiritualidade.
"Na ata de 15 de novembro de 1908 da citada federação [espírita] não há registros destes fatos, o nome do dirigente da suposta sessão não confere com a história, nem mesmo o nome de Zélio se faz presente", afirma Dias.”
- Alguém já viu esta ata?
- Desde quando, seja em federativa ou centro espírita, se faz ata de reunião pública?
Porém, existem outras ponderações interessantes a respeito disso.
O pesquisador Renato Guimarães, do blog Registros de Umbanda, publicou, em 2012, um estudo chamado: O verdadeiro local da primeira manifestação do Caboclo das Sete Encruzilhadas, em que conclui algo bastante curioso:
À época de Zélio, a Federação Espírita do Estado do Rio de Janeiro, funcionando em Niterói (daí a tradição ter preservado como “Federação de Niterói”), não possuía sede própria, funcionando num prédio do Centro Espírita Santo Agostinho (cujos membros foram, em parte, fundadores da federação), isto é, quando a Federação se reunia, utilizava-se uma das salas deste centro para realizar seus encontros.
O autor conclui, portanto, que na verdade Zélio teria participado de uma sessão neste centro espírita e não propriamente na federação, embora ela funcionasse no mesmo prédio. A confusão, neste caso, seria perfeitamente compreensível.
“Segundo especialistas, a história de Zélio como fundador da umbanda foi uma construção que passou a tomar forma nos anos 1960, quando o médium já era idoso. Em 1961, a jornalista e umbandista Lilia Ribeiro publicou pela primeira vez essa versão no jornal informativo Macaia, ligado à Tenda de Umbanda Luz, Esperança e Caridade, da qual ela era dirigente”.
A história de Zélio já era bastante conhecida na década de 1920 com as publicações de Leal de Souza no jornal A noite e também ganharam notoriedade nos anos 1930 quando a próxima série de reportagens se transformou no livro: O Espiritismo, a Magia e as Sete Linhas de Umbanda, publicado em 1933.
Em fins da década de 30, Zélio também teve participação na fundação da então Federação Espírita de Umbanda. Portanto, pode-se dizer que, pelo menos por 30 anos consecutivos, seu nome, o nome do caboclo e da sua tenda foram muito conhecidos.
O que parece ter ocorrido, porém, é que Zélio focou seu trabalho na Tenda Nossa Senhora da Piedade e gradativamente foi esquecido pelo mundo exterior, até que efetivamente sua história foi resgatada 20 anos depois por Lilia Ribeiro.
"Há indícios de que já havia práticas de umbanda muito semelhantes tanto em ritualística quanto em estética ao que acontece hoje muito antes de 1908", diz ele.”
Bom e desde quando a Umbanda de HOJE é semelhante a que ocorria em 1908? Qualquer um que veja, por exemplo, no Youtube, as filmagens de como funcionam as giras na TENSP, verá que trabalham de forma bem diferente da maioria dos terreiros.
No entanto, quais seriam estes indícios? Quais práticas? Onde? Novamente, nada...
Existiam cultos anteriores com alguma semelhança com a Umbanda? Sim. Nenhuma religião surge do nada e a Umbanda não é exceção: ela é uma mistura do Espiritismo, Catolicismo e Candomblé e, ao que tudo indica, essa mistura, fruto do processo religioso sincrético brasileiro já havia ocorrido outras vezes, em outros tempos, com outros nomes, outras práticas, outras crenças. O correto, portanto, seria dizer que existiam práticas sincréticas onde havia a manifestação de espíritos (como nos Calundus), mas daí dizer que essas práticas eram semelhantes à Umbanda, o passo é grande.
"Essa umbanda que tem Zélio como fundador é uma umbanda muito associada ao espiritismo em si. Mas há diversos autores que se sentem contemplados por essa narrativa e eles são pessoas fortemente associadas ao espiritismo e a algumas ideias esotéricas, místicas. Fogem da vivência do terreiro de fato. A estrutura umbandista já existia no século 19."
A Umbanda é profundamente associada ao Espiritismo. As ideias de Deus, mediunidade, reencarnação, espíritos, são todas vindas do Espiritismo, assim como os elementos de trabalho, como as imagens, velas, defumações, são todos de origem católica, assim como as oferendas, os atabaques, o uso das ervas, são todos de origem do Candomblé.
Agora, o que me chama a atenção e me parece um pensamento muito arrogante é dizer que “fogem da vivência de terreiro de fato”. Sem comentários...
Por fim, cabe dizer que, até meados da década de 1940, a maioria dos umbandistas se viam como espíritas. Considerava-se que a Umbanda era apenas um tipo diferente de Espiritismo, o que fica muito claro no Primeiro Congresso Brasileiro do Espiritismo de Umbanda.
Enfim, quando mergulhamos nas fontes históricas, seja em Leal de Souza ou mesmo nos anais do congresso, fica evidente que a Umbanda nascente era profundamente associada ao Espiritismo. O que não fica evidente nas fontes é qualquer origem afro...
“Watanabe lembra que a própria palavra umbanda vem das línguas quimbundo e umbundu da África Central e "significa algo como arte ou maneira de curar".
De fato, a palavra Umbanda existe neste idioma. Isto não é uma exclusividade. Existem várias palavras em português que significam coisas completamente diferentes em espanhol, inglês e, como descobri mais recentemente, até mesmo em russo... É uma ilusão achar que cada língua possui palavras únicas... Agora, o que se conhece como Umbanda em quimbundo tem alguma semelhança com o que se faz nos terreiros de Umbanda? A resposta é um sonoro não...
Porém, segundo outra interessante pesquisa de Renato Guimarães, transcrevendo fitas antigas de Zélio, descobriu-se que o nome original da religião era Alabanda (Deus ao nosso lado).
Algum tempo depois, por não soar muito bem, o nome foi trocado para Aumbanda, supostamente, com o mesmo significado. Tudo indica que, com o correr do tempo e pela forma de falar, Aumbanda acabou virando: A Umbanda.
"Zélio é a história de um homem branco classe média que se apropria da cultura dos centro-africanos e seus descendentes", resume o historiador Watanabe. "Além disso, apaga e invisibiliza a cultura dos centro-africanos ao se dizer fundador de algo que, na verdade, já existia."
Qual cultura de centro-africanos? Novamente, nenhuma citação, apenas afirmações soltas.
Agora, caro leitor, perceba: Zélio além de não ter fundado nada acabou apagando e invisibilizando outras culturas... É o ou não é uma bela inversão de valores?
Conclusão
Eu poderia ter citado outros trechos da matéria, mas creio que estes sejam suficientes. Fazia bastante tempo que não lia nada tão agressivo, seja pelas expressões utilizadas, seja pelo desmerecimento a tudo que Zélio fez e representou.
O que não surpreende, contudo, é que tais críticas sejam ideológicas... Tenta-se, a todo custo, classificar a Umbanda como uma religião afro-brasileira, apagando (sim) e invisibilizando (sim) a sua principal característica: o sincretismo religioso.
A Umbanda é uma religião brasileira, não afro-brasileira, não de matriz africana, mas totalmente cunhada, desenvolvida e moldada no Brasil, com influências do Espiritismo, do Catolicismo e do Candomblé, em maior conta, e também influenciada por conceitos/práticas esotéricas, místicas e indígenas. É isto que lhe confere seu caráter mestiço, logo, torna-la afro é desprezar todas as demais influências em detrimento de uma, sem qualquer lastro histórico para isso, apenas ideologia, pura e simplesmente.
Leonardo Montes
(Foto retirada do site da TENSP)
Quando me tornei trabalhador de terreiro, percebi algo muito desconfortável: eu ficava gripado mais vezes. Antes do terreiro, duas gripes por ano, em média. Depois do terreiro, cinco ou seis.
A pergunta de hoje é da Marcela e ela quer saber se um médium continua a trabalhar com seus guias, caso saia e depois retorne para a Umbanda.
Iniciada a caminhada mediúnica, o médium experimentará muitas dúvidas, tristezas e alegrias. Como dito no capítulo anterior, cada nova oportunidade de trabalho e aprendizado será um fator que enriquece o nosso espírito.
Contudo, isso também
passará.
Com o correr dos anos, tudo
que era novo e empolgante se tornará rotina. O médium perceberá que a queixa
dos consulentes serão quase sempre as mesmas, as orientações de seus guias para
os problemas apresentados serão quase sempre os mesmos (tendemos a pensar que
somos únicos, seja em nossas virtudes ou problemas, mas isso não é verdade) e,
com a rotina, vem o desânimo.
O desânimo será o primeiro
companheiro do médium. Depois, virão também os julgamentos dos companheiros, as
decepções consigo mesmo e com os outros, as dificuldades da vida, as
incompreensões familiares e, principalmente, a solidão.
Lidar com tudo isso não é
tarefa fácil, porém, algo inevitável e, cedo ou tarde, todos passam por isso,
às vezes, mais de uma vez.
Entretanto, ao lado de dores
e desafios, o médium também experimentará novas recargas de fé e ânimo, seja
num feedback estimulante, seja num fato mediúnico marcante: as entidades sempre
se esforçam para que o médium não esmoreça na caminhada.
E é por tudo isso que manter
a chama acesa (chama do ânimo, da esperança, da confiança e da fé), se mostra
uma tarefa tão árdua, porém, necessária...
Após anos e anos de
trabalho, a mediunidade tende a ficar cada vez mais solidificada. O médium
tende a se tornar mais confiante em si mesmo, na espiritualidade, na vida, em
Deus.
Os atendimentos espirituais
por seu intermédio ficarão mais firmes, confiáveis, profundos e isso insere o
médium numa escola nova de espiritualidade sobre a qual enriquecerá o seu
próprio espírito com ensinamentos e experiências que boa parte das pessoas
não-médiuns sequer sonhariam ser possível...
Contudo, aproveitar essa
experiência é tarefa de cada um. Ao lado dessas possibilidades, devo
testemunhar que também já vi médiuns com décadas de vivências continuarem tão
imaturos como quando começaram... O aprendizado chega para todos, mas a
absorção depende de cada um...
Ao longo de uma vida inteira
dedicada a caridade e ao bem, quantas pessoas seriam beneficiadas? Milhares,
certo? Essa é a beleza da mediunidade: mesmo sendo instrumentos imperfeitos,
podemos ser úteis na edificação de um mundo melhor, a começar por nós mesmos.
Por esta razão, encerro este
livreto com algo que sempre ouvi do Velho: Um dia, quando a morte houver
chegado para todos, nos reuniremos, médiuns e seus guias, debaixo de uma
frondosa árvore em Aruanda, quando então relembraremos os dias de luta na
Terra, erros e acertos e daremos graças a Deus por mais uma oportunidade de
trabalho vencida, aguardando a inspiração do alto para as novas tarefas que nos
aguardarão.
Neste dia, celebraremos.
Fim.
A pergunta de hoje é da Maria e ela quer saber como fazer para limpar as nossas guias.
A Umbanda é só mais uma religião: nem melhor, nem pior que as outras. Apenas, mais um caminho que Deus ofereceu a humanidade para quem com ela se identifique.
Como uma religião a mais na Terra, ela pode ser adotada ou abandonada, conforme os interesses de cada pessoa, sem quaisquer outros prejuízos e temores imaginários.
Segundo pesquisa divulgada em 2017, no Mednesp, cerca de 44% dos brasileiros frequentam mais de uma religião e cerca de 49% adotaram uma religião diferente daquela em que “nasceram”.
Isto quer dizer que quase 50% das pessoas mudam de religião em algum momento de suas vidas. Inclusive, é um direito (art. 5º da Constituição).
E na Umbanda, não é diferente!
Talvez, a pessoa tenha se desencantado; talvez se sinta desamparada; talvez tenha perdido a fé nos guias, na mediunidade, em Deus ou em si mesma; talvez, tenha encontrado uma religião que fale mais alto ao seu coração ou tenha sido forçada, pela circunstâncias da vida, a seguir por outra via... Existem várias razões e só quem passa por isso é que sabe seus motivos.
Porém, todos são livres para entrar e para sair de qualquer caminho de fé.
E, se chegou o seu momento, o que posso lhe dizer é: vá com Deus e que ele te abençoe!
Leonardo Montes
Este é o título de uma matéria do jornal Metrópoles, publicada em 08/03/2022, que mais parece uma piada: mas, não é!
Um homem se dirigia a um terreiro de Umbanda em Goiânia (GO), quando foi hostilizado por três pessoas que o perseguiram durante algum tempo gritando “macumbeiro” e dizendo que suas guias eram coisas do “demônio”.
Indignado, o homem procurou a delegacia do bairro para registar a ocorrência e, surpreendentemente, não conseguiu, afirmando que o delegado questionou se de fato havia visto tais pessoas ou se não eram apenas perturbações de quem “mexe com o diabo”.
Ainda segundo a vítima, o delegado teria dito que deveria se ajoelhar e orar a Deus para que fosse salvo... O caso ganhou as redes sociais e foi repercutido em vários sites de notícias.
Parece uma distopia, não é? Mas, o que podemos fazer?
Além das denúncias, é preciso que a Umbanda seja melhor compreendida, pois creio fortemente que o motor dessas ações seja (ao lado de um punhado de fanatismo), a ignorância. Eu passei por isso e talvez você que esteja lendo também tenha passado antes de entrar para algum terreiro...
Uma parcela significativa da sociedade não sabe o que de fato a Umbanda é. Quantos acham que cultuamos o diabo, sem sequer desconfiarem que nem acreditamos nele. Quantos pensam que nossos trabalhos existem para fazer o mal, acabar com a vida das pessoas?
Esta semana mesmo recebi uma mensagem muito curiosa... Uma pessoa entrou em contato comigo dizendo mais ou menos assim: a vida inteira vi a minha família falar mal da Umbanda, mas tudo que tenho pesquisado mostra que é uma religião que fala do bem e do amor, então, estou confusa...
É certo que existem umbandistas que não honram a sua fé e que cometem erros que jogam a imagem da religião no bueiro... Porém, isso acontece em todas as religiões: quantos padres não honram a batina? Quantos pastores não honram sua própria palavra? Quantos palestrantes espíritas enchem a boca para falar do evangelho e são tiranos domésticos? Isto ocorre em todas as religiões, é humano...
Porém, a Umbanda de verdade é muito bonita, simples, pura, fraterna, acolhedora, orientadora, amiga, irmã, espiritualizante, porém, ainda muito desconhecida...
É tarefa nossa torna-la conhecida. Tarefa minha e sua!
Leonardo Montes
Após um percurso que pode ser mais ou menos longo, conforme o processo de cada um, chegará o momento em que o médium terá aprendido tudo quanto necessita para iniciar o seu trabalho, ainda que não se sinta pronto para isso.
O medo de errar e de não conseguir passar corretamente as impressões da entidade, fará com que tal médium exercite sempre a humildade, não se deixando levar por megalomanias que só o conduziriam ladeira abaixo...
Não existe ausência de medo, existe enfrentamento ao medo e, para isso, somente a experiência. Porém, não se iluda: os primeiros consulentes sofrerão o peso do medo, da insegurança e também da inexperiência do médium novato e, embora exista uma certa incompreensão por parte dos consulentes, que quase sempre recorrem aos terreiros ávidos por resolverem numa gira problemas que criaram para si mesmos a vida inteira, deveria ser fato notório, conhecido e compreendido que todo médium novato precisa de tempo para adquirir segurança em seu trabalho mediúnico e que não há outro caminho para isso que não seja a prática.
Para ilustrar, contarei meu caso pessoal.
No terreiro onde me desenvolvi (assim como no atual onde trabalho), não existia uma cerimônia de fim de desenvolvimento ou qualquer coisa do tipo. Frequentemente, o médium comparecia ao trabalho pensando que só iria se desenvolver quando, repentinamente, era colocado, pela entidade chefe, para trabalhar.
O susto era grande e comigo não foi diferente.
Eu comecei a atuar num dia em que a casa estava cheia, porém, o número de médiuns estava bem reduzido. Pouquíssimos vieram em razão de uma forte chuva. A entidade chefe se manifestou e me disse que eu começaria a trabalhar naquela noite. Tremi de medo, porém, aceitei.
O trabalho transcorreu sem maiores problemas.
Contudo, relembrando o caso, não posso comparar os atendimentos que são realizados atualmente, sete anos depois, com os primeiros atendimentos que foram sofríveis. É natural, não tem escapatória!
Por isso, o médium deve aprender a conviver com o medo de errar, pois ele fatalmente vai errar e não será apenas uma vez... Paciência, somos humanos e esta é a verdade!
Ganhando confiança
O médium, porém, ganhará confiança conforme receber feedbacks positivos da consulência, o que é extremamente importante para quem esteja começando e, neste sentido, o dirigente deve permitir que tais informações cheguem ao médium.
Existe um temor bastante comum no meio umbandista que entende os elogios como algo ruim, como um incentivo à vaidade ou coisas do tipo. Porém, existe um abismo entre uma coisa e outra: um elogio sincero é um incentivo ao médium. A bajulação, por outro lado, deve sempre ser cortada pela raiz, pois como diz o velho dito popular: quem puxa saco, puxa tapete...
O médium aprenderá a confiar em si mesmo e em seus guias conforme receber feedbacks de seu trabalho. Sobre isso, narrarei mais uma experiência pessoal.
Estávamos numa cidade do interior de São Paulo onde realizaríamos um trabalho de passes com os pretos-velhos. Eu havia começado a trabalhar bem recentemente e tinha muito medo de errar.
Sentou-se uma senhora para se consultar com o Velho, quando começou a vir em minha cabeça um insistente pensamento:
— Fala pra ela que o Tio Antônio está aqui.
Relutei e procurei esquecer o pensamento que, insistente, se repetia na minha cabeça. Quase desincorporei, dado o incômodo. Não era como se o Velho estivesse falando comigo, era como se uma outra entidade falasse comigo.
Contudo, paralelamente, eu me questionava: e se ela não tiver nenhum tio chamado Antônio? Onde enfio a cara? Contudo, a frase se repetia...
Pensei, pensei, respirei fundo e resolvi deixar o processo fluir. Para minha surpresa – e, sim, foi uma baita surpresa – a senhora se emocionou muito, disse que seu tio, Antônio, havia desencarnado há um ano e que eram muito ligados.
Foi uma experiência decisiva para mim e foi a primeira vez que uma confirmação dessa natureza veio por meu intermédio e aquilo me fortaleceu muito e é por isso que acho que os retornos são importantes: o médium precisa saber que está indo por um bom caminho!
Converse com outros médiuns
Outro ponto fundamental para que o médium aprenda a ter confiança é a troca de experiências. Conversar uns com os outros, trocar ideias, comentários, impressões, ajuda muito o médium a perceber que seus desafios são os mesmos de todos.
Nem sempre isso será uma tarefa fácil. Lembro-me de uma experiência bem frustrante neste sentido. Eu havia cambonado uma médium muito experiente. Quando o trabalho terminou (como todo novato), eu estava muito empolgado com tudo que havia visto e aprendido com a entidade.
Procurei conversar com a médium, aproveitar sua experiência e foi frustrante. Muito secamente ela me disse:
— Eu não sei de nada, nem gosto de falar sobre isso. Desincorporou? Acabou pra mim.
Foi como um balde de água fria, nunca mais puxei assunto com ela. Contudo, nem todos são assim. Existem muitos médiuns que gostam de conversar, compartilhar suas experiências e, no universo da Umbanda, nada é mais prazeroso do que ouvir um médium experiente falar.
Então, a minha sugestão é: aproveite esta oportunidade ao máximo!
Chegou a hora do primeiro atendimento? Tente relaxar, confie, ore e entregue nas mãos da espiritualidade: você foi preparado para isso, agora é hora de dar o primeiro passo...
Confie!
A partir do momento em que o médium incorpora sozinho, conhece seus guias, sabe o que eles usam, consegue riscar o ponto e passa pelo menos um ano na segunda fase, chega-se, então, a última etapa do processo: a firmeza.
Algo que não foi dito anteriormente e que convém dizer agora é que o processo de desenvolvimento tende a começar com incorporações rápidas, não mais do que alguns minutos e que vão se intensificando ao longo do tempo.
Se o médium ficava incorporado, por exemplo, dez minutos, no começo da segunda fase, ao final, deverá conseguir ficar incorporado, pelo menos, meia hora. Se isto for alcançado, então, ele estará apto para a última etapa do processo, que consiste em ficar incorporado o maior tempo possível.
Nesta etapa, apenas um único chakra ainda não está satisfatoriamente ligado ao médium: o Coronário (responsável pela recepção do pensamento do guia) e é por esta razão que, na fase anterior, os médiuns não são incentivados a falar durante a incorporação além do necessário.
Aqui, porém, este chakra começará a se ligar de forma completa ao guia, permitindo que os pensamentos da entidade ecoem em sua mente com muita facilidade. Por isso, além de tentar “segurar” a incorporação o máximo possível (desejável, no mínimo, por duas horas), o médium deve igualmente se esforçar por “ouvir” a voz da entidade em sua própria mente.
Isto será possível uma vez que todos os demais chakras estando ligados, a entidade focará sua atenção no fortalecimento energético do Coronário que será a ponte mental entre o médium/guia. Assim, o médium incorpora, permanece no seu canto, em silêncio e se concentra apenas em ouvir a entidade incorporada.
Esta terceira etapa dura, em média, seis meses, porém, como todas as outras, pode se prolongar indefinidamente. Contudo, gradativamente, o médium conseguirá ouvir os pensamentos do seu guia. A princípio, tudo será confuso. Com os meses, mais clareza. Com os anos, limpidez.
Aprendendo a dar passes
Decorridos pelo menos três meses em que o médium está na firmeza, “ele” pode começar a aplicar passes em membros da casa e também do desenvolvimento (de forma alguma deve-se colocá-lo para dar passes em consulentes). Contudo, novamente, não deve ser incentivado a falar, a não ser o necessário.
Esta experiência muito enriquecerá o médium que começará a ter percepções mentais das questões aflitivas das pessoas, podendo captar pensamentos de seu guia quanto aos problemas, dificuldades e mesmo tratamentos que tal pessoa precisa se submeter.
Trata-se de uma experiência muito importante em que o médium começará a sentir o “gostinho” do que é ser um médium de corrente atuante. É muito comum que relate visões, cores, vozes, sensações físicas, etc. Tudo absolutamente normal.
Quando a entidade que conduz o desenvolvimento compreender que o médium está satisfatoriamente incorporado, então, além dos passes, “ele” pode ser autorizado a começar a falar, dar pequenas consultas, para ir treinando a capacidade de falar e aconselhar.
Esquerda
Se o leitor amigo prestou atenção nas páginas anteriores, deve ter notado que foquei meus exemplos em caboclos/pretos-velhos, isto porque, na Umbanda que pratico, estas são as linhas principais e responsáveis por 90% do processo de desenvolvimento dos médiuns.
Se o médium já incorpora caboclos e pretos-velhos com naturalidade, então, ele conseguirá incorporar qualquer outra linha da direita, razão pela qual não me deterei nestes outros casos, pois o princípio é o mesmo: o canal mediúnico estará desenvolvido, bastando que se habitue um pouco a qualquer outra entidade da direita e em poucos meses trabalhará perfeitamente bem com qualquer linha. Mas, e a esquerda?
Segundo este método, a esquerda só deve ser desenvolvida por médiuns que estejam no final da segunda fase (se estiverem muito bem mediunicamente) ou no início da terceira fase (de preferência). E isto por uma razão muito simples.
A energia da direita é uma energia sutil, difícil de ser captada, pois são os espíritos mais elevados do terreiro. Por esta razão, o desenvolvimento mediúnico deve começar pela direita e focar nela até que o médium já esteja praticamente pronto para só então iniciar com a esquerda, cuja vibração é forte, densa e de fácil incorporação.
A experiência pratica ao longo dos anos me mostrou que médiuns que começam pela esquerda acabam tendo muitas dificuldades em se habituar com a energia das entidades da direita, pois são por demais sutis se comparadas as energias pulsantes das entidades da esquerda.
Por isso a recomendação de que só se inicie o desenvolvimento da esquerda nesta terceira etapa (e, aqui, cabe a avaliação da entidade chefe para ver se o médium está mesmo pronto para este processo).
Energia da esquerda
Para efeito deste texto, entenda-se esquerda a manifestação de exus e pombagiras. Não me deterei em outras linhas por nunca ter trabalhado com elas ou por ter trabalhado muito pouco...
A energia da esquerda é uma energia densa, vibrante e intensa. Por isso, geralmente os médiuns se desenvolvem rapidamente com ela.
O método de desenvolvimento se assemelha ao da primeira fase: faz-se uma corrente em volta do médium e a entidade chefe manifestada faz o médium girar para que incorpore ou começa balançando suas mãos. Este procedimento, quase sempre, é necessário apenas nas primeiras vezes, pois logo o médium conseguirá incorporar sozinho.
Ao desenvolver com a esquerda, o que se observa é que se repetirá todas as fases anteriormente descritas, porém, elas ocorrerão rapidamente, pela facilidade com que se trabalha com a esquerda. Assim, no espaço de alguns meses o médium sairá da primeira fase e estará na terceira com bastante naturalidade.
Portanto, o mesmo processo utilizado anteriormente se repetirá: ficará em silêncio em seu canto, depois pedirá uma vela, logo começará a riscar o ponto e naturalmente solicitará os elementos de trabalho.
Observação importante: como a esquerda lida com bebidas alcoólicas bem fortes, além de serem o último item do desenvolvimento a entrar, deve-se sempre consultar a opinião da entidade chefe, a fim de evitar que o médium, ansioso, acabe “bebendo” pela entidade...
Dificuldades
Esta última etapa do desenvolvimento mediúnico tende a reproduzir os dois tipos de comportamentos anteriormente citados na primeira fase: impulsivos e inflexíveis, porém, com algumas diferenças. Vejamos a cada uma delas.
Chamo de inflexíveis aqueles médiuns que, mediunicamente, estão prontos, porém, emocionalmente, sentem-se ainda despreparados. Se este método for seguido, nesta etapa, não haverá dúvida de que estarão prontos para o fim do processo, contudo, intimamente e, por questões pessoais, podem não se sentir aptos, fazendo com que seu desenvolvimento se estenda muito tempo sem razão de ser.
Lembram-se quando, lá no começo, eu falei da terapia? É aqui que ela ajuda. Todo médium inseguro é, antes, uma pessoa insegura. Essa pessoa é insegura na família, em seus relacionamentos, no trabalho e, por extensão, também no terreiro. Assim, não é um problema de mediunidade, é um problema de insegurança pessoal...
Geralmente, a entidade chefe chama essas pessoas para conversar e alerta sobre o problema. Contudo, conforme a negação de cada um, este processo que poderia terminar em seis meses, acaba se prolongando por anos, desnecessariamente...
O médium também pode se apegar ao processo, às pessoas, à casa e, intimamente, não desejar que o processo termine, por se sentir seguro naquele espaço e naquele ambiente. Contudo, o desenvolvimento existe, justamente, para formar novos trabalhadores que devem engrossar as fileiras da Umbanda e não permanecer perpetuamente na condição de neófitos... Por isso, doa o que doer, eles precisam estar prontos para o trabalho!
Já os impulsivos, como o próprio nome indica, são aqueles que “morrem” de vontade de incorporar seus guardiões, estão roendo as unhas para começarem a dar consultas e, por isso mesmo, acabam indo para o espectro oposto do problema anterior: eles se antecipam demais, frequentemente, queimando etapas do seu desenvolvimento.
Quando isso acontece, a entidade chefe também costuma orientá-los, porém, se a ansiedade estiver muito forte, ela acabará por provocar o mesmo efeito do caso anterior: o desenvolvimento se estenderá sem necessidade, apenas para que o médium aprenda a esperar o tempo certo (paradoxal, não?).
Então, fica o alerta: impulsivos, pisem no freio. Vocês terão a vida toda para atuar como médiuns... E aos inflexíveis, confiem mais em vocês e em seus guias.
Fim do desenvolvimento
Todo o processo de desenvolvimento exposto neste livro leva, no mínimo, dois anos para se completar, sem tempo máximo definido. Em nosso terreiro, percebo que a maioria dos médiuns se desenvolvem entre 2/3 anos.
Seja como for, nunca esqueça este sábio conselho passado por um Exu: desenvolvimento não é a São Silvestre... Você não está competindo com os outros, mas consigo mesmo. Então, leve o tempo que levar, mas faça o desenvolvimento bem feito, com amor, fé e dedicação (Salve, seu Exu do Lodo!).
Somente a entidade chefe da casa é que pode dizer quando o médium estará pronto.
Contudo, lembre-se também: o fim do desenvolvimento não é o ápice da mediunidade, é apenas o fim da etapa inicial, o término do ensino fundamental... O médium terá ainda o ensino médio, a universidade, a pós-graduação, mestrado, etc.
Estes títulos, porém, quem confere é a própria vida no correr das décadas de trabalho perseverante no bem, em nome da caridade, com a graça de Deus.
Leonardo Montes
A primeira coisa que precisa ser dita é que o espírito não entra no corpo do médium, permanece sempre fora. O que chamamos de incorporação é o entrelaçamento energético entre os 7 principais chakras da entidade e do médium.
Estes chakras são: Coronário (topo da cabeça), Frontal (testa), Laríngeo (garganta), Cardíaco (coração), Umbilical (umbigo), Esplênico (baço), Básico (períneo). Você pode encontrar explicações sobre cada um deles na internet com facilidade, razão pela qual não me deterei em maiores considerações sobre suas funções.
O que importa ficar claro é que a incorporação é o entrelaçamento energético de cada um destes chakras entre o médium e a entidade. Quando isto ocorre, dizemos que houve a incorporação e, por isso, não se pode falar em incorporação parcial, pois, incorporação é sempre total, quando todos esses chakras estão ligados aos do guia, o que varia é a intensidade do fluxo energético que, sim, pode ser fraco, mediano ou forte.
O último chakra a ser conectado totalmente é o Coronário que é, justamente, o responsável por fazer com que os pensamentos da entidade cheguem ao médium, contudo, isso será detalhado mais adiante.
Incorporando
Esta fase compreende o período em que o médium começa a bater no peito (se for um caboclo) ou a fazer o sinal da cruz (se for um preto-velho) e vai até o momento em que incorpora sozinho, risca seu ponto, firma-o, pede os itens de trabalho e é capaz de falar com alguma desenvoltura. Portanto, este é o período mais longo do desenvolvimento e que deve levar, no mínimo, um ano para ser concluído.
Nesta etapa do processo, a maioria dos médiuns já consegue incorporar em pé, sem necessidade de girar. Contudo, eventualmente, pode ser preciso. Neste caso, basta que a entidade que esteja conduzindo o desenvolvimento chame este médium, peça que concentre, bafore seu cachimbo/charuto em sua cabeça para que comece o transe, que deve ser acompanhado de perto pelos cambones que, se necessário, devem fazer a corrente envolta do mesmo.
Nos primeiros meses, o médium incorporará, porém, não será capaz de falar. Permanecerá a maior parte do tempo de olhos fechados, por isso, assim que incorporar, um cambone deve se aproximar, cumprimentar a entidade verbalmente antes de tocar o médium (para evitar que ele se assuste) e, depois, deve conduzi-lo, lentamente, para saudar o Congá, levando-o depois para seu devido lugar. Em lá chegando, geralmente o médium ficará parado (se for caboclo) ou sentando em seu banquinho (se for um preto-velho).
Às vezes, abrirá os olhos, mas na maioria das vezes ficará em silêncio e concentrado. Esta primeira subfase, digamos assim, costuma durar em torno de seis meses.
Gradativamente, porém, conforme os meses correm, começará a solicitar uma vela, depois o giz para riscar o ponto, um outro determinado item, depois um cachimbo/charuto e, por fim, a bebida alcoólica (caso faça uso). A bebida alcoólica é sempre o último item a entrar no desenvolvimento e sempre com o acompanhamento de um cambone.
Nesta fase surgirão as primeiras frases e o médium incorporado será capaz de cumprimentar as pessoas, porém, não deve ser incentivado a conversar em demasia. Ainda não é o momento de dar consultas.
Ponto riscado
O ponto riscado pode aparecer de diferentes formas para os médiuns. Uns podem sonhar, outros podem ter intuições, etc. Normalmente, o que ocorre é que, nesta segunda fase do processo, durante a incorporação, o médium começa a perceber símbolos que surgem em sua tela mental.
Como o canal mediúnico está sendo construído, é normal que as imagens surjam e desapareçam e, por isso, o médium não deve se apegar aquilo que vê, mas deve desenhar o símbolo que lhe vier à mente.
Os símbolos que estiverem corretos permanecerão, os que forem eventuais imaginações, desaparecerão. Então, por exemplo, o médium vê uma estrela. Porém, um mês depois, a estrela dá lugar ao sol, ele fica confuso (é natural), porém, se o sol persiste ao longo de um tempo, então, ele se juntará a outros símbolos que, eventualmente, formarão o ponto riscado completo da entidade.
Quando isso acontece, o ponto não se altera mais e será confirmado pela entidade chefe, que pode pedir que seja escrito o nome da entidade incorporada no chão.
Dificuldades
Nesta segunda fase, o médium frequentemente fica meio paranoico. Imagina que todos estão olhando seu desenvolvimento, que as pessoas estão rindo de seus guias e se questiona se não está fingindo a manifestação, etc.
Isso ocorre (suspeito) como uma forma de mecanismo de defesa do seu próprio ego e tende a passar em alguns meses. Contudo, é importante que os médiuns se tranquilizem: todos passam por isso!
Além do mais, surgem muitas confusões no que se refere ao propósito do médium: será que é isso mesmo que quero para a minha vida? Será que sou médium mesmo? Enfim, você saberá quando estiver nesta fase e deve aproveitar estes questionamentos para se conhecer mais profundamente.
Não tenha medo de se fazer perguntas incômodas. Se você realmente quer aprender e crescer no campo mediúnico, deve estar aberto a se ver como realmente é e pode ser que em algum momento destas reflexões você conclua que não é bem isto que desejava para sua vida e pode mesmo acabar desistindo.
A minha recomendação é que não o faça, pois como expliquei no começo deste estudo, quem não tem caminho com a mediunidade, simplesmente, não nasce com ela. Porém, você é sempre senhor do próprio destino...
Algo que ajuda muito é conversar com outros médiuns e sempre pedir orientação às entidades.
Conhecendo os seus guias
É ainda nesta segunda fase que o médium conhecerá seus guias, saberá seus nomes, o que pode ocorrer através de uma conversa mental ou escrevendo-o no chão.
É o momento de estreitar laços com a entidade, entender como ela trabalha, que elementos usa, qual seu campo de atuação, etc. Aliás, falando em elementos de trabalho, sempre espere a entidade pedir para então você comprar.
Já vi muitos médiuns comprando lindos cachimbos e depois se decepcionando ao perceber que seu preto-velho preferia cigarro de palha, por exemplo.
É uma etapa muito importante e maravilhosa, pois nela você vai se relacionar de forma profunda com seu guia que será um grande amigo em sua vida e que, provavelmente, vai te acompanhar até o fim.
Por isso, mais do que a ansiedade pelo término do desenvolvimento que fica muito forte nesta fase, é preciso aproveitar bem essa experiência, que é única e deixará saudades.
Menos linhas, mais qualidade
Até agora, os exemplos citados por mim figuram sempre em torno de duas linhas: caboclos e pretos-velhos, por entender que estas são as duas linhas fundamentais da religião. Contudo, existem outras, como por exemplo: marinheiros, baianos, ciganos, crianças, boiadeiros, etc., porém, o método deste livro se aplica a qualquer outra linha de trabalho.
Ao longo dos meus anos de experiência, tenho aprendido que em matéria de mediunidade menos é mais. Explico.
Nesta fase do desenvolvimento, o médium quer experimentar novas energias, novas entidades. Assim, é muito comum a vontade de incorporar linhas que não se manifestam com tanta frequência, como por exemplo, ciganos ou baianos.
Assim, embora compreensível este desejo, percebi que, frequentemente, os médiuns que trabalham com menos linhas trabalham com mais qualidade. Isto é, médiuns que incorporam duas ou três entidades diferentes tendem a incorporá-las com melhor qualidade do que os que incorporam cinco, seis, sete linhas diferentes.
A explicação é simples: normalmente, não temos plasticidade mediúnica para canalizar tantas personalidades diferentes no mesmo aparelho psíquico. É por esta razão que, com alguma frequência, encontramos giras em que não é possível saber que linha está incorporada, a menos que alguém lhe fale. Os trejeitos se confundem, as falas se confundem e não é porque o médium não esteja firme ou bem concentrado, é que simplesmente não há plasticidade mediúnica suficiente para canalizar profundamente personalidades tão diferentes entre si...
A primeira vez que refleti sobre isso foi quando visitei um terreiro onde ocorreria uma gira com marinheiros. Esta linha nunca apareceu em meus caminhos mediúnicos e não parece ser comum em minha cidade, então, tive muito interesse em conhece-la.
Observei o trabalho e, em tudo, me parecia idêntico ao trabalho com os caboclos que eu havia visitado, uma semana antes, na mesma casa. Os médiuns se portavam da mesma forma, falavam da mesma maneira que na gira anterior, o que me chamou muito a atenção...
A princípio, pensei que eram caboclos novamente, mas fui informado que não, eram marinheiros...
A partir disso, comecei a observar minhas próprias incorporações e embora eu me julgue um médium mediano, percebi que também não conseguia incorporar bem todas as linhas que se manifestavam por meu intermédio e, desde então, em comum acordo com a espiritualidade, focando mais em qualidade que em quantidade, resolvi manter apenas três linhas de trabalho regulares: caboclos, pretos-velhos e exus, as que mais me identifico e as que incorporo melhor.
Assim, sugiro que todo terreiro repense suas linhas de trabalho. Não há necessidade de manter apenas estas que citei, pois cada terreiro tem seu amparo próprio, porém, recomendo fortemente que os médiuns se contentem em incorporar bem poucas entidades a terem um “acervo” vasto, porém, raso de todas elas.
Leonardo Montes
É NORMAL
O médium sentir dor nas costas, pernas, pés;
Vontade de ir ao banheiro;
Espirrar;
Tossir;
Coçar, etc.
Tudo isso é normal, pois durante o transe, o #médium não deixou de existir. Seus órgãos não cessaram de funcionar. Logo, todas as necessidades fisiológicas, incluindo sede, fome, sono, continuam normalmente.
Sempre vejo grandes (e inúteis) discussões sobre isso, uns afirmando que se o médium faz essas coisas é porque não está incorporado nada, outros dizendo que isto é falta de axé...
Num destes tópicos, a pessoa chegou a dizer que o médium só iria querer urinar se fosse ele quem bebesse o marafo e não a entidade. Olha a estreiteza de raciocínio... Será que esta pessoa pensa que a bebida ingerida é desmaterializada dentro do médium?
A pessoa sequer considerou que isso pode ocorrer também em qualquer gira, que o médium pode ter bebido muita água antes do trabalho ou que talvez seja como eu, alguém com a “bexiga pequena” e que, portanto, não consegue ficar muito tempo sem urinar...
Se a necessidade fisiológica do médium ficar muito evidente, o transe começará a sofrer. Por isso, caso o médium queira urinar, por exemplo, a entidade desincorpora, o médium vai ao banheiro, volta, incorpora novamente e o trabalho segue. Simples assim!
As vezes vejo algumas discussões nos grupos do Facebook que poderiam ser resolvidas com apenas um comentário lúcido.
Contudo, normalmente, este tipo de comentário se perde em meio a centenas de outros que vão dizendo, um após o outro, absurdos sem fim...
Leonardo Montes
Photo by Djamel Ighil from Pexels
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