As oferendas deixadas nas encruzilhadas eram para escravos fugitivos?
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Ninguém sabe, muito bem, o que faz um conteúdo viralizar. Pessoalmente, penso que seja uma combinação de fatores: conteúdo certo, na hora certa.
Eu
já tive alguns conteúdos viralizados: reflexões como “Ida ao Umbral” ou “Técnicas para incorporar melhor”, explodiram em número de visualizações em poucas semanas
e textos como: “Quaresma: quando abrem os portões do Umbral”, não apenas
viralizararam, como foram copiados, alterados e divulgados com nomes de outros
autores (eu nem imagino a cara de pau de alguém que coloca seu nome num texto
alheio).
Há
uns três anos começou a circular na internet um texto que supostamente explicava
a origem das oferendas nas encruzilhadas. O texto a que me refiro é este:
"De acordo com o professor Leandro (historiador da UnB) as
oferendas deixadas nas encruzilhadas era uma forma dos negros alimentarem seus
irmãos escravos que estavam fugindo dos feitores.
Os pretos escolhiam lugares estratégicos por onde escravos fugitivos
passariam e colocavam comida pesada; carne, frango e farofa porque sabiam da
fome e dos vários dias sem comer desses indivíduos e deixavam também uma boa
cachaça pra aliviar as dores do corpo e dar-lhes algum prazer na luta
cotidiana.
As velas eram postas em volta dos alimentos pra que animais não se
aproximassem e consumissem o que estava reservado para o irmão em fuga e aí
surge o que todos conhecem como macumba. O rito permanece sendo realizado pelas
religiões afro como forma de agradecimento e pedidos aos seus ancestrais e em
homenagem a seus santos.
A cultura branca e eurocêntrica foi quem desvirtuou a prática, para
causar medo, terror e abominação e reforçar os preconceitos e discriminações
contra os negros. Não tenho religião e não pratico nenhum culto mas gosto de
saber que já houve tanta solidariedade no mundo e que as pessoas se preocupavam
muito umas com as outras a ponto de fazerem um esforço pra alimentarem alguém
mesmo sem conhecerem o seu rosto. Hoje vejo tanta gente em igrejas e igrejas em
tantos lugares servindo apenas como instrumento de manipulação e exploração da
fé alheia para manutenção do poder. Enfim nós não evoluímos."
Segundo
o que apuraram vários sites, o que houve foi o seguinte: este professor fez um
comentário durante a apresentação de um TCC e uma pessoa presente escreveu o
texto a partir do que entendeu sobre a fala do mesmo.
Entretanto,
fica evidente que o entendimento da pessoa sobre esta questão está
completamente equivocado. Vamos fazer uma análise simples:
1)
Se existissem rotas conhecidas para fuga dos escravos a ponto de outros
escravos (cuja movimentação era bastante reduzida) conhecerem, por que os
fazendeiros não armavam emboscadas?
2)
O tempo de queima de uma vela é de cerca de duas horas. Então, esta suposta “proteção”
duraria pouco tempo e seria extremamente difícil que os escravos fugitivos
passassem justamente por ali, neste intervalo;
3) Onde os escravos conseguiam alimentos, cachaça e vela para disponibilizar nas
encruzilhadas?
E
por aí vai.
Contudo,
nem precisamos fazer esta análise. O texto é simplesmente um erro de interpretação
de quem ouviu uma fala, retirou-a do seu contexto e teve o seu texto viralizado
em redes sociais, copiados por centenas de páginas e perfis sem citar à fonte de
tal modo que sua origem se perdeu.
O
que encontramos hoje são apenas reproduções do texto original.
As oferendas nas encruzilhadas remontam a cultos antiquíssimos. Cada Orixá tem o seu “ponto de força”, como a pedreira para Xangô, a cachoeira para Oxum, a mata para Oxóssi e a encruzilhada para Exu.
Portanto,
trata-se de uma Fake News.
Leonardo Montes
Leonardo Montes
Obrigado pela elucidação dos fatos!
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